René Magritte, Espelho falso, 1928
Olhou-se no espelho, encarou.
O viço da pele havia sido substituída por marcas , algumas rugas, algumas manchas já eram presentes.
O cabelo, antes tão brilhante e volumoso , agora, apenas uma leve lembrança, mais fraco, já eram visíveis algumas mechas desbotadas.
O corpo, ah! o corpo, ainda vigoroso, mas a sombra do que foi um dia. As curvas, antes tão sensuais, agora muito mais sinuosas.
Poderia, caso isso fosse uma prioridade, ter feito mais ginástica, comido menos carboidratos, passado algo além do filtro solar, para garantir, ao menos a aparência fresca da juventude. Fazia anos que tinha decidido não usar mais maquiagem, nem batom, nem nada, gostava do rosto lavado, sem máscaras, sem fingimentos.
Sempre se considerou animada e divertida, namorou muito, conheceu muitos moços, se encantou por um deles, fizeram planos, casou-se,.
As gestações, haviam deixado marcas, os trinta quilos adquiridos em cada uma, com esforço e determinação, foram excluídos, mas o tempo não perdoa, o corpo muda, as formas se avolumam, isso é um dano? Podia ter pensado nisso, agora a barriga mais redonda que o desejável, o quadril, muitos números acima.
Muitas mudanças, apesar de ser reconhecida por antigos amigos, todos garantindo q
ue não havia mudado nada, ela sabia, o tempo passa, os amigos, assim como ela própria, também já não enxergam como antes, mas ninguém é só a casca, as mudanças chegaram também em suas atitudes, em seus pensamentos!
Para ela, afinal, a idade lhe trouxe vantagens, benefícios, finalmente sentia-se mais preparada para enfrentar o mundo, mais segura e natural.
Aprendera, finalmente, reconhecer seus desejos, e suas vontades, aprendeu a dizer não, aprendeu a pedir ajuda, a oferecer sua mão amiga.
É, o espelho não mente, estava muito parecida com sua mãe, chegava a lembrar a avó, os traços da família, com o tempo ficavam cada vez mais fortes.
Demorou, mas reconheceu, ela era, hoje fruto de todos os passos que deu durante a vida.
Estava satisfeita, tinha uma história para contar, vitórias, derrotas, sonhos, objetivos, estava tudo lá, sem por nem tirar, era ela. De fato, podia dizer, sentia-se feliz e realizada, suas escolhas lhe trouxeram até aqui.
Abriu a torneira, deu uma boa lavada na cara, escovou os dentes, penteou o cabelo, foi preparar o café, o dia já raiou.
7 comentários:
Boa reflexão! Que bom que você saiu bem dessa, isso às vezes detona umas crises, mas sempre vale a pena!
Beijos!!
O que seria de nós sem as crises?
Adorei a proposta, afinal estava precisando colocar os pingos nos meus Is!
Obrigada!
Paola
É isso aí. O viço vai desaparecendo a cada dois, três anos, mas existem as compensações: a tranqüilidade que a maturidade vai trazendo, a paciência, a sabedoria, a moderação na impulsividade. Mas nos dias que o espelho grita muito, sempre há a possibilidade de um retoquezinho básico que ninguém é de ferro. Hehehe
Beijos.
Lindo seu texto!!!!
Me sinto exatamente assim!
Que bom que a gente tem a capacidade de aceitar o que não pode sem mudado e de conseguir enxergar coisas boas em qualquer fase que a gente se encontra...A vida fica mais leve.
Uma história bonita, Paola, você tem uma bela história aqui contada! Esse é o seu melhor texto, uma serena maturidade nos traços, nas linhas, do rosto, da vida, das palavras e frases escolhidas pra falar de si, pra mostrar-se realizada com as escolhas e com o viver. Muito bom!
Aceito o seu chá, com muito gosto!!
Pelo que vi você é pinta, né? Então imagino que cada obra seja uma terapia completa - estou certa?
Que bomq ue você entendeu, agora que vique botei "pinta" em vez de ointora. Parece gíria, credo!
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